Arquivo do Autor: Sabrina Duran

Poder público e empresas privadas: pagamento de propina é via de mão dupla

Ministério Público anuncia prisão de quatro auditores da gestão Kassab acusados de cobrar propina para legalizar empreendimentos imobiliários. Tão importante quanto investigar suas relações com as empresas, é conhecer as conexões destas com outros gestores e obras públicas

O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP) anunciou na quarta-feira, 30 de outubro, a prisão, pela Polícia Civil, de quatro ex-funcionários públicos ligados à Subsecretaria da Receita da Prefeitura de São Paulo durante a gestão de Gilberto Kassab (PSD). Segundo investigação levada a cabo também pela Controladoria Geral do Município (CGM), eles são acusados de fazer parte de um esquema de corrupção que condicionava a liberação do Habite-se ao pagamento de propina pelo empreendedor imobiliário. O Habite-se é um documento emitido pela prefeitura garantindo que a construção foi concluída dentro das normas legais exigidas. Um fator imprescindível para a emissão do documento é o pagamento, pelo empreendedor, do ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) calculado sobre o custo total da obra. Foi nessa cobrança que os acusados armaram o esquema.

Segundo Ministério Público, esta pousada em Visconde de Mauá (RJ), pertence a um dos acusados de corrupção. Foto: Google/Ministério Público

Segundo Ministério Público, esta pousada em Visconde de Mauá (RJ) pertence a um dos acusados de corrupção. Foto: Google/Ministério Público

Segundo o Ministério Público, os auditores fiscais emitiam aos empreendedores guias com valores irrisórios de recolhimento de ISS. Depois, cobravam destes propinas de alto valor a serem depositadas em suas contas bancárias. Se o empresário não pagasse o montante pedido, não recebia o Habite-se. “Uma grande empresa empreendedora recolheu, a título de ISS, uma guia no valor de R$ 17,9 mil e, no dia seguinte, depositou R$ 630 mil na conta da empresa de titularidade de um dos auditores fiscais. O valor da propina corresponde a 35 vezes o montante que entrou nos cofres públicos”, exemplificou o Ministério Público em nota divulgada em 30 de outubro. O foco dos auditores, segundo as investigações, eram prédios residenciais e comerciais de alto padrão, cujo custo de construção passava dos R$ 50 milhões. O esquema gerou prejuízo de pelo menos R$ 200 milhões aos cofres públicos, de acordo com o MP.

Um dos ex-funcionários presos é dono de um apartamento duplex neste edifício de luxo em Juiz de Fora (MG), segundo apurou o MP. Foto: Google/Ministério Público

Um dos ex-funcionários presos é dono de um apartamento duplex neste edifício de luxo em Juiz de Fora (MG), segundo apurou o MP. Foto: Google/Ministério Público

Mas quem pagou a propina?

Uma das coisas que mais chamou a atenção na nota do Ministério Público foi a não abertura dos nomes das empresas do setor imobiliário que pagaram propina. No caso dos auditores presos, foram publicadas as iniciais dos seus nomes, cargo ocupado e ano de exoneração. Com esses dados, foi tarefa simples cruzar informações e chegar ao nome completo de cada um deles.

Na edição desta sexta-feira, 1º de novembro, o jornal “O Estado de S. Paulo” publicou reportagem revelando os nomes de pelo menos cinco empresas envolvidas no esquema: as incorporadoras Trisul, BKO, Tarjab, Alimonti e Brookfield.

Tão importante quanto investigar as relações dos ex-funcionários com as empresas é conhecer as conexões destas empresas com outros gestores públicos.

A partir dessas informações, outras questões surgirão, e o conjunto de respostas a cada uma delas talvez seja capaz de revelar acordos entre poder público e capital imobiliário ainda mais antigos e profundos do que o revelado pelo MP. Considerando que em algum momento os nomes de todas as empresas envolvidas serão divulgados ao público, há pelo menos quatro perguntas cruciais a serem feitas: essas empresas fizeram doação à campanha de algum político? Se sim, a qual/quais? Em qual ou quais eleições? As empresas estão ou estiveram envolvidas em alguma obra pública?

Doação de campanha é investimento

Em reportagem publicada em setembro no projeto Arquitetura da Gentrificação (AG), da Repórter Brasil, a apuração revelou, por meio de análise e cruzamento de dados, que empreiteiras, incorporadoras e construtoras foram responsáveis por mais de 57% das doações feitas só aos diretórios nacionais de partidos que elegeram os vereadores da capital paulista. Há ainda doações dessas empresas aos diretórios estaduais, municipais, aos comitês de campanha e aos próprios candidatos. Quase todos os vereadores que venceram o pleito de 2012 na capital paulista receberam, direta ou indiretamente, verbas de empresas do setor imobiliário. Segundo o juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei Ficha Limpa, dentro de um universo de milhares de empresas potencialmente doadoras pertencentes aos mais diversos segmentos, ter doações maciças vindas de poucas companhias não demonstra outra coisa senão o interesse na “troca de benefícios indevidos” entre políticos e agentes do setor privado. Já nas palavras do ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Torquato Jardim, as doações, muitas vezes, são “investimentos”. “Se o candidato ganhar a eleição, o doador ganha contratos”, afirmou Jardim.

Infográfico produzido pelo Arquitetura da Gentrificação mostra como doações de campanha feitas por empreiteiras influenciaram as políticas públicas de urbanização da cidade

Infográfico produzido pelo Arquitetura da Gentrificação mostra como doações de campanha feitas por empreiteiras influenciaram as políticas públicas de urbanização da cidade durante a gestão de José Serra (PSDB) e seu sucessor Gilberto Kassab (PSD)

O (anti) exemplo de Serra e Kassab

Durante os mandatos de José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (PSD) na Prefeitura de São Paulo (2005-2012), ficou clara a relação de “pagamento do investimento” feito por meio de contratos de obras milionárias – alguns deles fraudulentos – que impactaram e impactam até hoje a cidade e seus moradores, especialmente os que viviam em favelas e foram expulsos de suas casas, de maneira violenta, para que ali brotassem novas torres comerciais, residenciais, avenidas e viadutos questionáveis do ponto de vista do planejamento urbano.

Em entrevista em vídeo a ser publicada em breve no site do Arquitetura da Gentrificação, a urbanista Ermínia Maricato fala sobre o casamento de interesses entre o capital imobiliário, a indústria automotiva e o poder público que afronta leis para dar vazão à gana construtiva com fins meramente rentistas, e que está levando as cidades a um abismo de muitos níveis de profundidade: do aumento abusivo do preço da terra e do custo de vida à verticalização irracional dos bairros, do caos da mobilidade à expulsão violenta da população de menor renda das regiões centrais da cidade.

Diante desse cenário, é possível dizer que o processo de gentrificação contemporâneo que ocorre na capital paulista tem parte das suas raízes nas doações de campanha maciças feitas por empreiteiras aos gestores, e “pagas” por estes, depois de eleitos, por meio de contratos de obras que, em vez de revigorarem a cidade, a mortificam juntamente com seus moradores.

O caixa 2 da relação

A rede de corrupção que o MP revelou na última quarta-feira é, de alguma forma, o “caixa 2” das relações questionáveis entre poder público e empresas do setor imobiliário, e que não é “privilégio” de nenhum partido ou gestão. Considerando que o caixa 1, ou seja, as doações de campanha feitas dentro da lei, já são bastante daninhas, o potencial destrutivo das propinas é ainda maior. Se é possível comprar um Habite-se, é possível também, dentro da mesma lógica do crime, comprar alvarás, licenças, laudos técnicos e outros documentos que podem evitar – ou precipitar – tragédias urbanas.

Por isso é essencial aprofundar a apuração nas redes de relações dessas empresas com gestores públicos, a começar por aqueles a quem, por ventura, tenham feito doação de campanha, seja em administrações anteriores ou na atual.

Segundo a nota do Ministério Público, o órgão “investiga se as empresas foram vítimas de concussão, porque não teriam outra opção para obter o certificado de quitação do ISS”. Toda investigação é necessária. Mas independentemente do nível de participação no esquema que essas companhias tenham tido, é importante nunca perder de vista que no cenário de mentiras e ilegalidades em que atuam os corruptos do poder público, a manutenção desse tipo de crime só é possível porque há a figura do corruptor do setor privado que aceita a oferta.

Dilma sanciona lei que garante ao setor privado o poder de desapropriar e lucrar em obras de urbanização

A presidente Dilma Rousseff sancionou ontem, 24/10, a lei 12873, que trata “de obras e serviços de engenharia relacionados à modernização, construção, ampliação ou reforma de armazéns destinados às atividades de guarda e conservação de produtos agropecuários”.

Como explicou a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik em artigo sobre o tema, o texto da lei ganhou uma série de “penduricalhos”, entre eles, uma alteração estratégica do artigo 4º do Decreto-Lei 3365, de 1941, que trata das desapropriações por utilidade pública.

A alteração do artigo 4º do Decreto-Lei, sancionada ontem por Dilma, diz o seguinte: “Quando a desapropriação destinar-se à urbanização ou à reurbanização realizada mediante concessão ou parceria público-privada, o edital de licitação poderá prever que a receita decorrente da revenda ou utilização imobiliária integre projeto associado por conta e risco do concessionário, garantido ao poder concedente no mínimo o ressarcimento dos desembolsos com indenizações, quando estas ficarem sob sua responsabilidade.”

Nas palavras de Rolnik, “isso vai permitir que uma empresa privada que ganhe uma concessão para reurbanizar um bairro numa cidade qualquer – Botafogo, no Rio de Janeiro, por exemplo –, possa não apenas realizar as obras, como já acontece hoje, mas também tornar-se dona do bairro inteiro, pois também poderá desapropriar para depois investir em megaempreendimentos imobiliários naquele território”.

Ou seja: este Cavalo de Tróia colocado no meio de lei que trata de “reforma de armazéns” permitirá que o poder público turbine suas parcerias com as empreiteiras, entregando bairros inteiros (a cidade, no fim das contas) aos interesses do mercado imobiliário, com o respaldo da lei e em nível nacional.

Aqui em São Paulo, Gilberto Kassab abriu o precedente para esse tipo de operação com o Projeto Nova Luz. O projeto utilizava o controverso instrumento chamado “concessão urbanística”, no qual o poder público concede ao privado o poder de desapropriar e lucrar sobre a área desapropriada. O Nova Luz foi “engavetado” pelo prefeito Fernando Haddad, mas reapareceu ampliado – e agora turbinado – com a PPP de Habitação do Centro, um projeto de R$ 4,6 bilhões para a construção de 20 mil moradias na região central da cidade e que já teve decreto de desapropriação publicado pelo governador Geraldo Alckmin com o endereço de mais de 900 imóveis que serão desapropriados. Em mapeamento feito por moradores, a maioria dos imóveis são residências, comércios e indústrias ocupados e consolidados há décadas, ao contrário do que dizem os gestores da PPP, de que seriam imóveis vazios ou sub-utilizados.

Se para os cidadãos e a cidade esta alteração incluída na lei aprovada ontem por Dilma representa uma porta aberta para a interferência daninha e agressiva do mercado imobiliário nas políticas públicas de habitação e urbanização da cidade, para os gestores públicos – prefeitos, governadores e vereadores -, que têm suas campanhas financiadas por empreiteiras, será mais uma forma eficiente de pagar, com o corpo da cidade, as dívidas contraídas durante as eleições junto ao mercado imobiliário.

Desembargador volta atrás na própria decisão e revoga liminar que suspendia PPP de Habitação do Centro

Menos de dois meses depois de suspender temporariamente a PPP de Habitação do Centro, o desembargador Xavier de Aquino voltou atrás em sua própria decisão e revogou a liminar que concedeu em 23 de agosto ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MP). Ontem, 16 de outubro, o site do Tribunal de Justiça do Estado publicou a revogação de Aquino, que reconsiderou sua decisão anterior e concluiu que “houve audiência pública, levada a efeito no dia 27.02.2013 (…) sendo certo que dela participaram quase uma centena de pessoas, destacando-se representantes de movimentos de moradia, Defensoria Pública, Universidades, bem como entidades da sociedade civil, quando então o tema nuclear foi amplamente discutido (houve lista de presença e ata respectiva)”.

O promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo Maurício Ribeiro Lopes pedia a paralisação da PPP de habitação com o argumento de que não houve participação popular suficiente em nenhuma fase do projeto. A liminar foi negada em primeira instância, em julho desse ano, pelo juiz de Direito Randolfo Ferraz de Campos, da 14a. Vara de Fazenda Pública. O promotor entrou com recurso e conseguiu a decisão favorável do desembargador Xavier de Aquino em agosto. Agora, com a revogação da liminar, a PPP de Habitação do Centro não está mais suspensa.

Em entrevista a este blog na tarde de hoje (17/10), o promotor Maurício Ribeiro Lopes comentou a nova decisão: “Há uma incorreção [na justificativa do desembargador Xavier de Aquino] ao dizer que houve uma audiência pública em fevereiro. Não foi em fevereiro, foi em março, e essa audiência pública foi realizada não para atender qualquer disposição do Estatuto da Cidade, mas para atender a lei de licitações. Então é uma audiência pública com uma finalidade completamente diversa da participação popular prevista no Estatuto da Cidade como uma condição primeira da gestão democrática da cidade. Isso provoca uma alteração profunda da vida da cidade. As pessoas afetadas não foram cientificadas em nenhum momento para que pudessem, de alguma forma, participar do projeto”, afirmou o promotor.

O próximo passo

A revogação da liminar não encerra a ação. Outros dois desembargadores ainda devem decidir pelo deferimento ou indeferimento da liminar ao MP. “Haverá um parecer em segunda instância do Ministério Público. Isso vai a julgamento. Pode ser que no julgamento a decisão seja revertida e volte a liminar”, explicou Ribeiro Lopes. “A disposição do Ministério Público de rediscutir essa questão da participação popular e rediscutindo agora várias questões de mérito desse programa Casa Paulista, nós vamos levar a efeito com o Executivo, Judiciário, com quem tiver que ser levado, com a sociedade sobretudo”, completou.

Estado “já sabia”

Em 1 de outubro, quando a PPP ainda estava paralisada, o Ministério Público convocou uma reunião com gestores públicos para discutir a PPP de Habitação do Centro. Estiveram na reunião o promotor Ribeiro Lopes, o subsecretário da Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, o diretor do Instituto Urbem, Philip Yang, responsável pelo projeto urbanístico vencedor da licitacão da PPP; e um advogado representando os moradores afetados pelo decreto de desapropriação de mais de 900 imóveis assinado em junho pelo governador Geraldo Alckmin.

O objetivo da reunião pedida pelo MP era negociar com o poder público formas efetivas de participação da sociedade civil na construção e acompanhamento integral do projeto da PPP, e não apenas em questões pontuais e periféricas. Dias depois do encontro, o promotor falou a este blog sobre o resultado da conversa: “Eles [poder público] querem esperar a decisão judicial sobre a ação que foi proposta. Até julgar o agravo não querem avançar muito. Eles têm esperança de que vão derrubar a decisão judicial e que não vão precisar negociar com o Ministério Público, e vão fazer as coisas como eles acham que devem ser feitas”.

O registro de movimentações no site do Tribunal de Justiça de São Paulo deixa claro que a “esperança” do Estado na derrubada da liminar não era à toa. Como notou o promotor, a pressão do poder público para a revogação fica evidente na quantidade de documentos anexados ao processo pelo Estado após a suspensão da PPP e pelos pedidos oficiais de reconsideração do despacho.

Mesmo com PPP de Habitação suspensa por liminar, Reinaldo Iapequino, Andrea Matarazzo e Police Neto fazem audiência sobre o projeto

À esquerda, o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, e os vereadores Andrea Matarazzo e Police Neto compondo a mesa da audiência

À esquerda, o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, e os vereadores Andrea Matarazzo e Police Neto compondo a mesa da audiência

Foi realizada ontem (9/10), na Câmara de Vereadores, audiência pública sobre a PPP de Habitação no Centro. À mesa estavam o vereador Andrea Matarazzo (PSDB), presidente da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Câmara; o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino; e o vereador Police Neto (PSD), também membro da comissão de política urbana. O diretor do Instituto Urbem, Philip Yang, responsável pelo projeto da PPP, não compunha a mesa, mas acompanhava as discussões junto aos demais presentes. Os participantes da audiência não chegavam a 30 pessoas.

Diretor do Instituto Urbem, Philip Yang, acompanha audiência (à extrema direita da foto)

Diretor do Instituto Urbem, Philip Yang, acompanha audiência (à extrema direita da foto)

Este blog soube da audiência “por acaso”, quando buscava na agenda online da Câmara dados sobre outra atividade pública que aconteceria no mesmo dia e horário. No momento em que a reportagem chegou à Câmara, o debate sobre a PPP já estava no fim. O vídeo com a íntegra da audiência será disponibilizado nos próximos dias na galeria de vídeos da Câmara Municipal, segundo informou um funcionário da casa.

Agenda online da Câmara Municipal com anúncio da audiência sobre a PPP de Habitação no Centro

Agenda online da Câmara Municipal com anúncio da audiência sobre a PPP de Habitação no Centro

Suspensão da PPP e legalidade da audiência

Em entrevista a este blog, o promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo, Maurício Ribeiro Lopes, que conseguiu liminar suspendendo a PPP temporariamente, afirmou, a respeito das implicações da liminar, que “o que [o poder público] fizer será nulo, dinheiro perdido, caso de improbidade”.

Questionado pelo blog sobre a legalidade da audiência pública realizada ontem na Câmara Municipal – já que a PPP continua suspensa – o promotor explicou: “a Câmara Municipal pode fazer o que ela quiser pois a PPP é do Governo do Estado e em relação a ele vigora a paralisação”.

PPP de Habitação segue suspensa, e governo se mostra pouco disposto a ouvir a sociedade

Conforme este blog anunciou em post publicado no dia 19 de setembro, no dia 1 de outubro foi realizada uma reunião convocada pelo Ministério Público (MP) para discutir a PPP de Habitação do Centro, levada adiante pela Casa Paulista, agência do Governo do Estado vinculada à Secretaria Estadual de Habitação (SEHAB).

Estiveram na reunião o promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo Maurício Ribeiro Lopes, do Ministério Público; o subsecretário da Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, o diretor do Instituto Urbem, Philip Yang, responsável pelo projeto urbanístico vencedor da licitacão da PPP; e um advogado representando os moradores afetados pelo decreto de desapropriação de mais de 900 imóveis assinado em junho pelo governador Geraldo Alckmin.

Em entrevista concedida ontem (4/10) ao blog do projeto Arquitetura da Gentrificação, o promotor Ribeiro Lopes afirmou que não se avançou muito na reunião. “Eles  querem esperar a decisão judicial sobre a ação que foi proposta. Até julgar o agravo não querem avançar muito. Eles têm esperança de que vão derrubar a decisão judicial e que não vão precisar negociar com o Ministério Público, e vão fazer as coisas como eles acham que devem ser feitas”, disse o promotor.

Quando fala em “agravo”, Ribeiro Lopes refere-se ao recurso que enviou ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo depois que teve liminar negada em primeira instância, em julho desse ano, para paralisar a PPP de Habitação. No dia 23 de agosto, o desembargador Xavier de Aquino, da 1a. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, deferiu liminar favorável ao recurso enviado pelo Ministério Público, o que provocou a suspensão temporária da PPP de Habitação. “O que [a SEHAB] fizer será nulo, dinheiro perdido, caso de improbidade”, explicou o promotor sobre as implicações da liminar. Outros dois desembargadores ainda precisam emitir suas decisões – que podem ser favoráveis ou não.

Participação popular efetiva

Segundo o promotor, o Ministério Público quer negociar com a SEHAB uma participação maior da sociedade civil na condução da PPP. A suspensão conseguida com a liminar era justamente para ganhar tempo para discutir os meios de efetivar essa participação. “Eu quero audiências públicas para que os afetados sejam ouvidos, para que seja detalhado o plano, para que sejam apresentadas alternativas para ocupação de áreas. O decreto [de desapropriação] é muito abrangente, ele pega áreas de comércio e residências consolidados, não considera eventuais áreas que estão livres na cidade como prioridade, enfim, queria discutir muitas coisas com eles”.

Ao que tudo indica, no entanto, a Secretaria Estadual de Habitação não está aberta à interferência da sociedade civil na construção da PPP, e espera que a liminar conseguida provisoriamente pelo MP seja derrubada para, assim, levar adiante o projeto da Casa Paulista do jeito que está.

Revisão do decreto

O blog questionou o promotor sobre a revisão, pela SEHAB, dos imóveis contidos no decreto de desapropriação. A promessa de revisão foi feita no dia 20 de agosto pelo subsecretário da Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, durante debate realizado com os atingidos pelo decreto na sede da Associação Viva o Centro. Iapequino ouviu diversas reclamações de moradores presentes ao encontro de que seus imóveis residenciais e comerciais, em pleno uso, constavam na lista feita pelo governo e que, em tese, deveria contemplar apenas imóveis sub ou não utilizados. A íntegra do debate pode ser vista em vídeo aqui.

Sobre esta revisão, o promotor Ribeiro Lopes afirmou que o governo a suspendeu em virtude da decisão judicial que paralisou a PPP e para a qual a SEHAB aguarda um desfecho.

Questionado sobre quando sairia a decisão final dos outros dois desembargardores, o promotor foi enfático: “eu não falo sobre prazos do poder Judiciário. Para mim é um enigma. Pode ser um mês, pode ser um ano. Não tem expectativa”.

Até lá, a PPP de Habitação do Centro segue suspensa.

Acompanhe o andamento da suspensão temporária da PPP de Habitação

Noticiamos ontem (19/9) que a parceria público-privada (PPP) de habitação no centro, do governo do Estado, foi temporariamente suspensa por liminar concedida pelo desembargador Xavier de Aquino ao Ministério Público. Outros dois desembargadores precisam decidir por conceder ou não a liminar – por isso a suspensão noticiada ainda é temporária.

É possível acompanhar o processo todo online no site do Tribunal de Justiça de São Paulo. O link direto é este: https://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/show.do?processo.foro=990&processo.codigo=RI001WKR20000

Se ele não funcionar, o caminho completo é:

1. acesse o site do TJ: https://www.tjsp.jus.br/

2. À direita da tela, no campo “Consulta de Processos”, selecione “processo 2a. instância” e digite o número do processo: 01568503420138260000

 

 

PPP de habitação no centro é temporariamente paralisada

Áreas de intervenção da PPP de habitação no centro

Áreas de intervenção da PPP de habitação no centro

Com liminar, promotor de Habitação e Urbanismo do Ministério Público de São Paulo consegue “tempo para negociar” com gestores a participação popular no projeto. Reunião entre MP, Secretaria Estadual de Habitação, Agência Casa Paulista e Instituto Urbem está marcada para dia 1/10

 

A parceria público-privada (PPP) de habitação da Agência Casa Paulista, do Governo do Estado de São Paulo, que pretende construir mais de 20 mil unidades habitacionais de interesse social no centro da cidade, está temporariamente paralisada. A notícia foi dada ontem (18/9) pelo promotor Maurício Ribeiro Lopes, da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo da capital. A paralisação se deu no dia 23 de agosto, depois que o desembargador Xavier de Aquino, da 1a. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, deferiu liminar favorável ao recurso enviado pelo Ministério Público. Outros dois desembargadores ainda precisam emitir suas decisões – que podem ser favoráveis ou não. “Isso deve acontecer nos próximos dias”, informou o promotor Ribeiro Lopes. Mas com este primeiro parecer favorável o governo paulista já não pode mais dar segmento ao projeto, para o qual estava sendo anunciado o lançamento, em breve, de edital de licitação das empresas que executarão as obras. “O que fizer será nulo, dinheiro perdido, caso de improbidade”, explicou o promotor sobre as implicações da liminar.

O recurso foi enviado por Lopes ao tribunal depois que ele teve liminar negada em primeira instância, em julho desse ano, pelo juiz de direito Randolfo Ferraz de Campos, da 14a. Vara de Fazenda Pública. O promotor pedia a paralisação da PPP de habitação com o argumento de que não houve participação popular suficiente em nenhuma fase do projeto. Para negar a liminar, o juiz entendeu que houve, sim, participação pública satisfatória, e que “conceder aqui a liminar na forma como se requereu na ação implicará atrasar significativamente a implementação da PPP Habitacional (…)”. Leia aqui a decisão do juiz na íntegra.

Promotor Maurício Ribeiro Lopes. Foto: Edson Lopes J. / Agência de notícias do Governo do Estado de SP

Promotor Maurício Ribeiro Lopes. Foto: Edson Lopes J. / Agência de notícias do Governo do Estado de SP

Com a paralisação de agora, o promotor diz que ganha tempo para negociar com o poder público a participação da sociedade no desenvolvimento do projeto. “O que eu tenho muito receio desse modelo de PPP com essa finalidade é que, na verdade, os preços podem ser ditados por uma lógica perversa de mercado, visando o lucro, e não por uma lógica que é do direito de moradia, que é de proteção de partes mais fracas”, diz Ribeiro Lopes. “Eu quero negociar primeiro com o poder público para abrir à sociedade a discussão disso. Começar do zero. Eu não quero aproveitar o que está feito. Dizer que o Urbem investiu… azar do Urbem [vencedor da concorrência para desenvolver o projeto urbanístico da PPP]. Não foi dinheiro público gasto. Foi dinheiro privado e em benefício privado. Se foi um mau investimento isso é problema deles. Não temos nenhum compromisso com o Urbem em comprar a ideia deles como veio. O que eu acho importante é discutir essa política e abrir para a sociedade”.

O promotor informou que já está marcada uma reunião para o dia 1 de outubro, no Ministério Público, entre ele e o secretário estadual de Habitação, Sílvio Torres, o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, e o diretor do Instituto Urbem, Philip Yang.

Confira a seguir a entrevista que o Arquitetura da Gentrificação fez ontem, 18/9, com o promotor Maurício Ribeiro Lopes. Nela, ele fala sobre a falta de transparência da PPP da Agência Casa Paulista, da falta de critério do decreto de desapropriações assinado por Geraldo Alckmin e sobre a evidência de interesses obscuros por trás do projeto.

 

O que o Ministério Público questiona em relação à PPP do centro?

Estamos discutindo a questão da participação popular na formulação da política pública na área de habitação na região central da cidade. É absurdo imaginar que isso pode ser feito sem a participação popular. Existem várias Zonas Especiais de Interesse Especial (ZEIS) que são afetadas, não tem nenhum conselho gestor que tenha sido ouvido sobre isso, há uma sobreposição de políticas habitacionais da União, do município, do Estado. A gente precisa colocar isso em pratos mais limpos. Eu não estou entrando no mérito se [a PPP] é boa ou má. A questão, para mim, é preliminar: não se faz essa política sem participação popular.

E a questão do decreto de desapropriação?

Para mim ficou claro que os 900 imóveis afetados por esse decreto expropriatório não foram vistoriados pelo poder Executivo. Existem interesses econômicos ocultos por trás disso, o que é muito sério. Vou dar o exemplo de uma situação que me chamou muito a atenção. É desapropriado um imóvel na rua São Caetano, esquina com avenida Tiradentes, onde funciona um estabelecimento comercial há muitos anos. No projeto, ele vai ser desapropriado para fazer um outro conjunto comercial embaixo e uma torre em cima. Pergunto: o proprietário foi consultado? Foi perguntado se ele não queria aderir à PPP para permitir a edificação em cima e ele ficar com a área de baixo? Faltou critério. Isso, inclusive, foi confessado pelo Sílvio Torres (Secretário Estadual de Habitação) numa audiência pública na Assembleia Legislativa.

O Estado pode desapropriar terras do município?

Toda a base territorial do Estado é sobre municípios. Se o Estado quer fazer uma obra do metrô, ele desapropria terras da cidade. O que o Estado não pode é desapropriar um bem pertencente ao município, não pode desapropriar um prédio público que pertença ao município ou à União.

Como deveria ser essa política pública de habitação?

Eu quero aproveitar essa oportunidade da decisão judicial e ver como a gente pode caminhar em um acordo para construir essa política pública. Eu não tenho clareza de como ela deve ser desenvolvida, eu não tenho essa receita. Acho que o Executivo também não tem e não aceito que o Urbem dê esta receita. Isso tem que ser construído com os diversos interesses sociais que estão aí postos à disposição. Em primeiro lugar, teria que haver um mapeamento para as áreas que estão livres na cidade antes de se pensar em desapropriação de áreas que estão ocupadas com gente morando ou com renda sendo produzida. Depois, estabelecer um critério qualitativo e quantitativo para ter uma política consistente de formação de bairros. Isso envolveria uma articulação de políticas públicas entre Estado e município que eu ainda não vi. Eu tenho visto uma competição de quem constrói uma casa em menos tempo, seja lá a que custo social e urbanístico isso se dê. Isso é nocivo.

Consta no projeto do Urbem, desenvolvido em 2012, que àquela época o atual secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, era um dos diretores do instituto. Consta também que Tereza Herling, atual secretária-adjunta da SMDU, atuou como conselheira do projeto do Urbem que venceu a concorrrência. Sendo parte, hoje, do poder público, Mello Franco e Tereza teriam isenção para falar contra o projeto que ajudaram a desenvolver?

Talvez no tempo em que tenha sido feito esse projeto, ele [Fernando de Mello Franco] sequer tivesse expectativa de ser secretário. O que existe ali é um trabalho profissional dele àquela época. Eu não vejo um conflito de interesses. Acho que o que ele precisa é mostrar como se compatibilizam com isso as políticas estadual e municipal, como se faz essa interface. Mas eu não seria leviano de dizer que há um conflito de interesses, mas sem prejuízo de outros entendimentos em sentido contrário.

Reinaldo Iapequino foi questionado sobre se a PPP se assemelhava ao Projeto Nova Luz em relação ao uso do instrumento de concessão urbanística (poder público concede às empresas privadas o poder de desapropriar, construir e lucrar sobre as áreas desapropriadas). Ele disse que não porque a PPP não desapropria lotes, mas apenas propriedades. Um mapeamento feito por moradores das áreas desapropriadas pelo decreto mostrou que diversos imóveis contíguos desapropriados acabam formando lotes…

Na questão da Nova Luz, havia uma desapropriação de 42 quarteirões. O que nós temos [na PPP] são manchas na região central da cidade, são pedaços de diversos bairros. Agora, não é porque não pega um todo, como pegava o Nova Luz, que aquele instrumento concessão urbanística esteja abandonado. Você pode trabalhar de modo difuso, com mini-concessões urbanísticas em função de cada um desses conglomerados da mesma maneira.

Essa outorga do poder público do direito de desapropriar ao setor privado é legal?

É questionável.

É possível, então, questionar o projeto por aí também, pela questão da legalidade dessa outorga?

Olha, a história da legalidade é o último ponto que eu quero discutir. E por quê? As cabeças do Direito são cérebros do mal. O Direito explica qualquer coisa. O Direito explicou a escravidão. O Direito justifica qualquer situação. Você sempre vai encontrar ou vai construir instrumentos jurídicos que permitem cumprir a finalidade que o administrador quer. O Direito é a ferramenta mais perigosa para ser usada aqui. Se não for legal hoje, não quer dizer que não seja legal amanhã ou depois.

Ainda sobre o poder público conceder ao setor privado o poder de desapropriar: Iapequino disse que não há problema nisso porque o que está sendo feito na PPP é uma obra pública. Uma política habitacional pode ser considerada obra pública nos moldes previstos na lei que permite ao poder público conceder ao setor privado o direito de desapropriar?

Veja como a coisa vai na contramão. A licitação do metrô para a linha 6 é uma PPP, e estava previsto no primeiro edital que desapropriações e reassentamentos ficariam a cargo do parceiro privado. Não apareceu nenhum interessado. A primeira coisa que o Estado fez foi chamar aquilo de volta para si. Agora, no novo edital publicado, o Estado é quem assume desapropriação e reassentamento. Ora, isso é para metrô. Me parece que, com mais razão, ele iria fazer isso para habitação. Desapropriação de imóveis para habitação que sejam imóveis residenciais, eu não tenho dúvidas de que é o Estado que deveria fazer isso.

Tanto a Secretaria Estadual de Habitação, quanto a Agência Casa Paulista não divulgaram, até hoje, o projeto urbanístico completo feito pelo Instituto Urbem e nem os modelos jurídico e econômico que serão utilizados nessa PPP. Como o senhor vê isso?

O fato de não haver uma divulgação não me parece correto numa época em que o poder público tem uma obrigação de transparência. Não é possível que exista um segredo de Estado sobre aquilo que afeta a vida de tantas pessoas. E sabemos que tem gente que tem cópia inteirinha disso nas mãos. Setores do mercado imobiliário seguramente estão muito bem informados disso, do que se pretende. Quem não sabe são os fracos na situação.

No começo da conversa o senhor disse que havia interesses comerciais obscuros nesse projeto. Com base no que o senhor afirma isso?

Com base na falta de clareza na apresentação [do projeto].  Não há garantia, por exemplo, de que os polos de comércio existentes serão mantidos como tais. Pode haver induzimento de uma outra tipologia de atividade empresarial que vai se realizar.

Há uma conivência do poder público com o setor privado?

Não acho que conivência seja a palavra. Acho que a coisa está muito mal amarrada dentro do poder público e entre o poder público e a sociedade. Acho que o poder público não tem clareza, tanto que não houve vistoria física dos imóveis que não foram colocados no decreto, ele não tem clareza dos imóveis que está desapropriando. Ele está desapropriando em nome de um interesse que não é dele, ou que não é só dele, ou que em parte não é dele. Acho isso muito perigoso. Isso exige explicação.

Primeira página da liminar concedida por desembargador

Primeira página da liminar concedida por desembargador

Segunda página da liminar concedida por desembargador

Segunda página da liminar concedida por desembargador

 

Amor e ódio: o que as cidades de Nova York, Guangzhou e São Paulo têm em comum em relação ao comércio informal

Por Luciana Itikawa, André Alcântara e Geilson Sampaio.

Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos

Ambulante no BID chamado “Midtown Box” ou Caixa da Zona Financeira em Nova York. Foto: Luciana Itikawa. Agosto 2013)

Ambulante no BID chamado “Midtown Box” ou Caixa da Zona Financeira em Nova York. Foto: Luciana Itikawa. Agosto 2013)

Duane Jackson é um comerciante de rua da categoria “veterano de guerra”, de Nova York. Foi ele quem fez o alerta sobre uma bomba colocada na Times Square em 2010. Por ter se tratado de uma ação dentro de um tema tão sensível para o povo americano como o terrorismo, Jackson foi alçado ao status de herói nacional. A ironia é que ele faz parte de um dos segmentos mais reprimidos da cidade, a saber, o trabalhador informal de rua.

Foi justamente a informalidade o principal assunto tratado no seminário “Trabalho e Solidariedade: EUA, China e Além” (Labor and Global Solidarity: US, China and Beyond), realizado no dia 12 de agosto em Nova York, organizado pelas Universidades da Cidade de Nova York (CUNY) e pela Universidade da Califórnia (campi de Berkeley e Los Angeles).

No seminário, o projeto “Trabalho Informal e Direito à Cidade”, do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, apresentou sua experiência de advocacy junto aos ambulantes em São Paulo na mesa que tratou das experiências políticas e de organização de trabalhadores da China, Índia, Brasil e México. Para Luciana Itikawa, representante do projeto no evento, “os gestores estão assumindo um discurso cada vez mais moralizante e conservador para encobrir os processos de segregação”.

Neste seminário foram apresentados diferentes situações de precarização de trabalhadores informais nas grandes cidades desses quatro países, e as respectivas reações de organização, articulação e resistência contra esses processos.

A segregação: planos urbanísticos e higienização dos espaços públicos

Segundo Jane Jacobs, no seu clássico Morte e Vida nas Grandes Cidades[1], os “olhos na rua tornam os espaços públicos mais seguros”. Para o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, no entanto, esta frase pode soar incrivelmente ambígua: quais olhos e para quem é mais seguro? Para os negócios ou para a população?

As gestões dos últimos prefeitos nova-iorquinos, com particular contribuição de Bloomberg (2002- até agora), têm sido “inspiradores” da gestão militarizada e privatizada dos projetos urbanísticos. Desde 1997, com a constituição dos distritos de melhoria de negócios (Business Improvement Districts – BIDs) e da campanha “Qualidade de Vida”, tocada pelo prefeito anterior Rudolph Giuliani (1997-2001), o binômio segurança pública e gestão urbana cada vez menos existe como campos distintos na administração pública.

Giuliani, seguido por seu sucessor, Bloomberg, empreendeu uma poderosa combinação entre um forte esquema de repressão policial, a criação de projetos urbanísticos pontuais marcadamente imobiliários e a utilização do sistema tributário sobre o território como mecanismo segregador. O emprego estratégico da repressão policial tem gerado tensionamentos diários, particularmente nas áreas consolidadas dos BIDs ou nas fronteiras onde o capital não avançou, com conflitos raciais e/ou étnicos (maioria negra ou muçulmana)[2].

Segundo o jornal New York Times, Bloomberg conseguiu em 12 anos reconfigurar a cidade de Nova York[3], modificando porções significativas do território. Nenhuma outra cidade conseguiu construir 170.000 unidades habitacionais em 10 anos para as classes média alta e alta, nem adensar-se intensamente através da revisão do zoneamento de um terço de sua área, tampouco redesenhar as áreas costeiras e portuária, mesmo em plena crise econômica.

Highline, parque arborizado linear elevado no bairro do Chelsea. Forte intervenção urbana iniciada em 2009, com importante reconfiguração da orla ao longo do parque. Foto: Luciana Itikawa. Agosto 2013)

Highline, parque arborizado linear elevado no bairro do Chelsea. Forte intervenção urbana iniciada em 2009, com importante reconfiguração da orla ao longo do parque. Foto: Luciana Itikawa. Agosto 2013)

Processos de segregação nos espaços públicos, como a repressão à população em situação de rua, catadores e ambulantes, têm sido mais intensos nos BIDs. Na cidade de Nova York existem hoje 64 BIDs, que administram bairros, corredores de negócio e locais turísticos. O maior BID de Nova York é na área central, chamado de “Aliança do Centro”, onde os valores imobiliários são um dos mais altos e onde está localizado o novo World Trade Center. Para isso, os BIDs não só utilizam regras urbanísticas específicas, como têm utilizado da sua segurança privada para coibir, reprimir ou anular a manifestação da pobreza nos espaços públicos. Além disso, têm colocado elementos paisagísticos como obstáculos, postes, muretas e lanças, para evitar a “invasão” dessa população.

Simultaneamente, prefeitos das grandes metrópoles pelo mundo têm utilizado dessa cartilha para combinar 1) regras de exceção urbanística, 2) aumento nos tributos e taxas sobre a terra, e 3) violência policial em áreas pontuais de interesse do mercado imobiliário, sempre com a finalidade de expulsar a população pobre.

Na administração de Giuliani, em 1995, foi criado um comitê com o valoroso título de “Comitê de Revisão do Comércio de Rua”, cuja composição era de representantes de departamentos governamentais e dos BIDs. Este comitê marcadamente conservador, que nada tinha de revisão, mas sim de repressão, acabou aprovando perímetros e eixos inteiros de restrição do trabalho nos espaços públicos, fechando mais de 130 ruas e criando uma zona de restrição chamada de “Caixa da Zona Financeira”.

Segundo a organização Centro de Justiça Urbana (Urban Justice Center)[4], a segurança privada nos BIDs expulsam trabalhadores na frente de lojas ou edifícios, mesmo estes sendo portadores de licença. A fiscalização do comércio de rua, apesar de ser responsabilidade da Polícia de Nova York, acaba sendo arbitrariamente aplicado nos BIDs[5]. Outro aspecto segregador, apesar de legal, é o crescimento em quantidade e valor das multas aos trabalhadores ambulantes. Uma multa hoje vale US$ 1.000,00 àquele que não cumprir um leque de mais de centenas de regras, apesar da média dos rendimentos mensais da categoria não passar de US$ 1.200,00. A cobrança abusiva e a dificuldade de interpor recursos resultam na inoperância deste sistema: apenas 6% das multas são pagas.

A repressão: a multiplicação dos olhos da vigilância e a repressão aos olhos do trabalho informal

A versão chinesa de cidade de Nova York poderia ser a cidade de Guangzhou, importante porto da China na foz do Rio das Pérolas um dos principais entroncamentos da rede de transporte chinesa. Na província cantonesa, Guangzhou empreende desde 2007 uma das ações mais vigorosas de vigilância e repressão ao comércio informal nos espaços públicos. Como parte dos planos de fiscalização dos trabalhadores da área central, chamados de chengguan[6], o prefeito Chen Jianhua de Guangzhou instalou 250.000 câmeras e um sistema de radar para “capturar” os trabalhadores que não possuem licença para trabalhar nas ruas. Além dos esforços municipais, há um Comitê de Fiscalização Nacional que também realiza inspeções nos municípios que não executam a retirada dos trabalhadores de determinados espaços públicos.

A moralização: o discurso cada vez mais conservador e, sobretudo, competitivo das cidades

Um discurso promovido pelo Estado chinês sobre modernização, embelezamento urbano e desenvolvimento econômico tem sido cada vez mais homogeneizante e higienizador. Um termo bastante emblemático utilizado nos processos segregadores é a palavra chinesa wenming, que significa civilidade ou civilização. Campanhas municipais e nacionais chinesas, com premiações e ranqueamento de cidades mais “civilizadas” são faces de uma valoração que aproxima, cada vez mais, os conceitos de modernização, higiene e “civilidade”. Tais campanhas conferem “status de honra” aos domicílios ou às cidades que tiverem melhor cumprido regras de “civilidade, modelo e higiene”[7].

A instigação pelo governo chinês para que as cidades cumpram essas regras por meio de campeonatos “de civilidade” tem como objetivo obrigá-las a atrair cada vez mais investimentos e atingirem desenvolvimento econômico rapidamente. Valeria uma reflexão profunda sobre a imposição da velocidade e da intensidade dessas transformações. Entretanto, o esforço de criatividade e investimentos em planos urbanísticos idílicos e mirabolantes mostra uma tentativa deliberada dos gestores das metrópoles apagarem qualquer manifestação de desigualdade e pobreza dos locais de interesse do setor imobiliário.

Em 2008, a cidade de Guanzhou foi identificada como “Cidade Mundial Beta”, pelo Índice Cidade Global produzido pela Rede de Pesquisa sobre Cidades Mundiais e Globalização (the Globalization and World Cities Research Network, GaWC). Em 2012, em outro ranqueamento internacional de cidades, no Índice Cidades Globais (Global Cities Index)[8], a cidade de Nova York foi apontada como a primeira no ranking, com o índice 6,35; enquanto São Paulo estava em 33º lugar com 2.19 pontos; Cidade do México, em 34º lugar com 2.19;  Mumbai, em 45º, com 1.79 pontos; e a cidade de Guangzhou estava na 60ª colocação com 0.82 pontos

O discurso moralizante parece, portanto, apenas uma fachada para encobrir um projeto deliberado do capital para empreender sua reprodução em larga escala sobre o trabalho e sobre terra. Não parece novidade se não fosse um detalhe geográfico. Para Harvey, a reprodução do capital não se dá apenas pela exploração da força de trabalho, seja na intensificação, quanto na apropriação. Segundo ele, a reprodução do capital está, sobretudo, conjugada à questão urbana não mais pela extensão territorial, mas por processos de despossessão da terra e do trabalho, com mecanismos cada vez mais sofisticados e complexos[9].

Alternativas e movimentos contrários: exceções à regra e experiências de resistência e articulação populares

Apesar das incríveis manifestações de resistência da população, poucas alternativas têm sido vistas em relação aos movimentos avassaladores capitalistas.  Dois exemplos vêm da cidade de Nova York que articulam questões transversais como mobilidade urbana, trabalho e saúde pública. O primeiro exemplo é a bicicleta como meio de transporte. Mesmo após a pressão dos ciclistas em Nova York ter conseguido a construção de 724 km de ciclovias permanentes em 12 anos, esta frente tem sofrido derrotas recentes no parlamento local por conta do lobby automobilístico.

Ciclovia permanente em Manhattan na 7ª Avenida. Foto: Luciana Itikawa. Agosto de 2013)

Ciclovia permanente em Manhattan na 7ª Avenida. Foto: Luciana Itikawa. Agosto de 2013)

Outra pressão popular na cidade de Nova York que resultou em um pequeno avanço aos trabalhadores informais é o programa “Carrinhos Verdes” (Green Carts), que ampliou em 1.000 o número de licenças para os comerciantes de rua. Este programa é resultado de mais de 10 anos de pressão de uma rede de mais de 2.000 trabalhadores ambulantes de várias regiões da cidade e conta com o apoio do projeto Comerciantes de Rua (The Street Vendor Project) e do Centro de Justiça Urbana (Urban Justice Center).

Este programa foi criado com o intuito de levar comidas frescas e saudáveis aos distritos com maior índice de obesidade e diabetes na cidade de Nova York. Curiosamente, alia a questão do trabalho, abastecimento e saúde pública. A diferença do programa “Carrinhos Verdes” em relação às normas dos outros comerciantes de rua é que o trabalhador não precisa ficar parado e pode transitar dentro de um determinado perímetro permitido pela Prefeitura. Apesar das regras impostas serem extremamente exigentes[10], os trabalhadores recebem crédito, capacitação e assessoria de marketing através do financiamento de um fundo privado. A ampliação das licenças, entretanto, está longe de contemplar a grande demanda de trabalhadores – em torno de 20.000 trabalhadores para 5.000 licenças, segundo o projeto Comerciantes de Rua (Street Vendor Project).

Outros dois exemplos vêm de cidades latino-americanas como fortalecimento da luta popular na reivindicação pelo direito à cidade. Na Cidade do México e em São Paulo existem experiências muito semelhantes na constituição de uma rede de trabalhadores informais, avessa ao tradicional caminho de dependência clientelista, porém frágeis do ponto de vista da incidência em políticas públicas. São redes que possuem um perfil heterogêneo, mais conectado horizontalmente aos movimentos sociais e menos hierarquicamente às centrais sindicais.

No México, existe uma rede de artesãos de rua chamada Associação Nacional de Artesãos de Coyoacán (ANAC), que articula os trabalhadores com organizações comunitárias populares e utiliza dos instrumentos democráticos (assembleias, comissões) para encaminhar suas reivindicações (protestos, campanhas, etc).  Este é um desenho de alianças e processos decisórios bem diversos do sindicato majoritário de trabalhadores ambulantes, a Frente Nacional do Comércio Informal (FNCI), que mantinha relações clientelistas durante os 70 anos do Partido Republicano Institucional (PRI) na cidade do México, e as reproduz com o atual Partido Republicano Democrático (PRD).

Em São Paulo, o Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos tem dado suporte, desde 2011, na constituição de uma rede de trabalhadores ambulantes – o Fórum dos Ambulantes –, que hoje reúne representantes de 15 regiões da cidade (centro, norte, sul, leste e oeste). Até 2011, a única forma das associações e sindicatos de trabalhadores ambulantes conduzirem suas reivindicações era por meio do contato com assessores parlamentares que encaminhavam as demandas indiretamente ao Executivo, com o ônus da fidelidade eleitoral. Tal triangulação levou a persistência sistemática da fragmentação entre os trabalhadores, que pouco avançou na consolidação de políticas públicas para o comércio de rua com incremento das oportunidades de trabalho.

Além da dificuldade da ingerência política sobre a organização dos trabalhadores, o processo de proibição total das licenças dos trabalhadores na gestão anterior ocorreu simultaneamente na mesma época em que grandes planos urbanísticos e megaeventos estavam sendo discutidos ou decididos na cidade, como a Operação urbana Lapa-Brás, o projeto Nova Luz e a Copa do Mundo em 2014.

O Fórum dos Ambulantes, depois do processo de organização e resistência popular ter conseguido uma conquista preliminar com uma ação civil pública na gestão municipal passada, barrou o processo de exclusão. Hoje, entretanto, tem passado por frustrações sucessivas na atual gestão do prefeito Fernando Haddad. A primeira delas é a de não conseguir resolver, por meio do diálogo, todo o passivo de arbitrariedades e ilegalidades deixados pela gestão anterior, nem conseguir discutir um Plano Municipal do Comércio Ambulante em um canal de discussão instituído pelo Judiciário e assumido pela Prefeitura.

A segunda foi ter participado do processo participativo de revisão do Plano Diretor da cidade com duas sugestões concretas de inclusão de diretrizes para o comércio de rua. Apesar de ter participado das plenárias em cinco regiões (Santana, Lapa, Jabaquara, São Miguel e Centro), as propostas não foram incorporadas pela Prefeitura na minuta do plano.

As duas propostas do Fórum dos Ambulantes tinham exatamente o objetivo de descentralizar as oportunidades ocupacionais no território por meio da construção de mercados populares e planejamento urbano dos espaços públicos para o comércio de rua nos bairros.

O prefeito Fernando Haddad alegou que está desenvolvendo o Plano de Desenvolvimento Econômico da Zona Leste, onde irá promover usos e ocupações geradores de renda e emprego, porém não está claro como isso irá acontecer.

Ocupar a rua, preencher a cidade, embargar o rolo compressor em curso no território. Para grande parte daqueles que participaram ou participam da construção da articulação em rede de movimentos sociais, estudantes, trabalhadores, etc., a visibilidade em larga escala no território é a melhor estratégia para assustar os monopólios do poder econômico e político. Entretanto, não está claro para ninguém se estes têm a mesma eficácia e conseguirão verdadeiramente desafiar o capital. Só o tempo nos dirá.

 


[1] Jacobs, J. Morte e Vida de Grandes Cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

[2] Reportagem de 16 de Agosto do jornal New York Times: “Um Prefeito que coloca a Wall Street em Primeiro lugar”. Ver em < https://www.nytimes.com/2013/08/18/nyregion/a-mayor-who-puts-wall-street-first.html?pagewanted=1>

[3] Levantamento feito pelo Jornal New York Times sobre os “avanços” e retrocessos da administração Bloomberg. Ver em < https://www.nytimes.com/newsgraphics/2013/08/18/reshaping-new-york/?ref=nyregionspecial>

[4] Centro de Justiça Urbana (Urban Justice Center), ONG que presta assessoria jurídica e articulação aos trabalhadores, em convênio com a Universidade da Cidade de Nova York (CUNY).

[5] Relatório “New York City Street Vendors” de 2012 da Escola de Arquitetura, Planejamento Urbano e Preservação da Universidade de Columbia.

[6] Chengguan é a abreviação de chengshi guanli xingzheng zhifa jumunicipal administration law enforcement bureau. Este é uma avaliação feita pela pesquisadora Amy Hanser, do Departamento de Sociologia da Universidade de British Columbia, que apresentou sua pesquisa: Comerciantes de Rua e Governança Urbana na China (Street Vendors and Urban Governance in China), na Conferência Labor and Global Solidarity em Nova York em agosto de 2013.

[7] Idem 4.

[8] O índice da Globalization and World Cities Research Network (GaWC) foi criado pela Universidade inglesa de  Loughborough.  O Global Cities Index foi elaborado pelo jornal americano de Política Externa, baseado nos estudos de Saskia Sassen sobre cidades globais. Este último tem como critério mostrar “a dimensão, a capacidade de interconectividade e determinação para instaurar agendas globais, perigos transnacionais climáticos, bem como servir como nós de integração global. São máquinas de crescimento para seus países e portas para recursos nas suas regiões”.

[9] Ver Fix, M. Financeirização e transformações recentes no Circuito Imobiliário no Brasil. Inst. Economia UNICAMP, 2012. Harvey, D. Enigmas do Capital, São Paulo: Boitempo Editorial, 2012.

[10] Idem item 3.

Casa Paulista divulga parte do estudo do Instituto Urbem para a PPP de habitação no centro de São Paulo

Site da Agência Casa Paulista já com os arquivos do estudo disponíveis para consulta

Site da Agência Casa Paulista já com os arquivos do estudo disponíveis para consulta

Por Sabrina Duran

A Agência Casa Paulista disponibilizou em seu site parte dos estudos desenvolvidos pelo Instituto Urbem para a PPP de habitação no centro da cidade. Consta no site que os estudos divulgados se referem apenas ao tomo I produzido pelo Urbem. Segundo entrevista dada pelo diretor do instituto, Philip Yang, o trabalho completo desenvolvido por sua equipe tem 12 tomos de 300 páginas cada um.

Em contato na semana passada com a reportagem do Arquitetura da Gentrificação (AG), o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, afirmou que o conteúdo disponibilizado no site seria uma compilação das propostas de modelagem urbanística, jurídica e econômica feitas pelas 5 empresas que venceram o edital de chamamento público para apresentação de estudos técnicos. Segundo Iapequino, os 5 estudos vencedores não foram 100% aproveitados, e a compilação das partes utilizadas totalizariam a íntegra da PPP.

“Para a elaboração desta Modelagem Final, foram utilizados os conteúdos dos estudos financeiros, jurídicos e técnico-operacionais das empresas/consórcios proponentes, com o seguinte grau de aproveitamento: 58% (cinquenta e oito por cento) do URBEM-Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole; 6% (seis por cento) do Consórcio Reviva São Paulo; 6% (seis por cento) do Bairro Novo Empreendimentos Imobiliários S/A e Arquiteto Pedro Taddei e Associados Ltda, calculados sobre R$ 6,24 milhões (seis milhões duzentos e quarenta mil reais), correspondentes a 69,33% (sessenta e nove inteiros e trinta e três décimos por cento) do total estimado de ressarcimento”, diz o texto da ata da 53ª Reunião Ordinária do Conselho Gestor do Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas, realizada no dia 20/2. A ata desta reunião também só foi publicada hoje no site da Agência Casa Paulista.

Ao que parece, apenas a modelagem urbanística foi disponibilizada no site por enquanto. Os estudos foram divulgados após quase um mês desde a primeira solicitação feita pelo AG à Agência Casa Paulista via Secretaria Estadual de Habitação, e após quase um ano desde a finalização do estudo feito pelo Instituto Urbem.

Projeto de PPP de habitação deve ser divulgado na íntegra hoje, segundo promessa de subsecretário

Subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino. Foto / SEHAB

Subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino. Foto / SEHAB

Na última semana, o subsecretário da Agência Casa Paulista, Reinaldo Iapequino, entrou em contato com a reportagem do Arquitetura da Gentrificação (AG) para informar que a íntegra do projeto para a PPP de habitação no centro de São Paulo estaria disponível no site da Casa Paulista hoje, segunda-feira, 2/9. Até às 13h, quando este post foi escrito, o documento ainda não havia sido publicado.

Insistência

A Agência Casa Paulista está submetida à Secretaria Estadual de Habitação (SEHAB) e é responsável por levar adiante projetos de habitação social. O contato do subsecretário foi fruto da insistência da equipe de reportagem do AG para ter acesso à íntegra do projeto desenvolvido pelo Instituto Urbem, vencedor da licitação, para esta PPP. A SEHAB estadual, responsável maior pela iniciativa, tem sido fortemente criticada por estar levando adiante a parceria sem a devida participação pública.

Lançado em abril de 2012, o projeto ainda não foi divulgado publicamente na íntegra. Sem as especificações completas do modelo urbanístico, jurídico e econômico adotado pelo governo, é impossível saber os planos concretos dos governos estadual e municipal para a região com esta PPP.

Desapropriações

Em junho, o governador Geraldo Alckmin assinou o decreto 59.273/2013, desapropriando 890 imóveis supostamente subutilizados na região onde será feita a PPP, e que serviriam aos fins do projeto. O decreto pegou os moradores de surpresa. Em primeiro lugar porque estes não foram previamente avisados sobre a medida. Muitos souberam do decreto por meio de advogados que, sabendo do decreto previamente, enviaram cartas aos moradores oferecendo seus serviços para ajudar no embate com o poder público. Em segundo lugar, porque as desapropriações incidiam não só sobre imóveis subutilizados ou vazios, mas também sobre residências e comércios ocupados há décadas. Até creche e convento constavam na lista de desapropriações.

Indignados, moradores e comerciantes da região vem participando de debates e audiências com Iapequino e o próprio secretário de habitação do Estado, Silvio Torres, na tentativa de revogar o documento. Torres considera a possibilidade de retirar do decreto os imóveis ocupados, mas resiste na sua total revogação.

Audiência hoje

Para seguir na discussão do tema, acontece hoje (2/9), às 19hs, na Assembleia Legislativa (Av. Pedro Álvares Cabral, 201 – Auditório Teotônio Vilela) audiência pública contra o decreto 59.273/2013. A audiência foi iniciativa do deputado Carlos Giannazi (PSOL).