Nesse momento da apuração das pautas do Arquitetura da Gentrificação (AG), estamos pesquisando detalhes da prestação de contas de candidatos a vereador das eleições de 2012 disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em 2006, candidatos a qualquer cargo foram obrigados a fornecer no site do TSE (art. 28, inciso II, parágrafo 4), nomes de doadores e valores doados por estes. Estas informações, no entanto, deviam ser abertas apenas no fim das eleições, até um mês depois do pleito.
Em 2012, o Juiz de Direito Márlon Reis, do Maranhão, conseguiu obrigar os candidatos de três municípios daquele estado a fazerem a prestação de contas completa, com nome de doadores e valores, antes do fim da disputa eleitoral, nas duas prestações preliminares que os candidatos já eram obrigados a fazer em agosto e setembro. O juiz, que é um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, usou a Lei de Acesso à Informação para justificar a medida.
Aberto o precedente, o TSE estendeu a medida a todo o país, obrigando candidatos de todos Estados a abrirem suas contas durante as eleições.
Mas nem tudo está explícito no site do TSE. Para esses dados que faltam e que nos interessam no contexto da reportagem que estamos produzindo, resolvemos entrar em contato com os partidos após analisar as planilhas de prestação de contas de cada um dos vereadores eleitos na cidade de São Paulo em 2012, além das planilhas dos comitês de campanha e diretórios de partidos. Formulamos perguntas bastante específicas e objetivas.
O retorno que recebemos dos partidos até o momento não foi dos mais generosos em termos de informações e disposição em abrir os dados. Mas nada fora da curva. Trata-se de um reflexo da falta da cultura da transparência entendida como norma de conduta, como escrevi em post anterior a este, e não como cumprimento de uma lei/regra específica. Não fosse este o cenário, não receberíamos como resposta padrão a frase “todos os dados estão disponíveis no site do TSE”. Não, não estão. E eles sabem disso.
Pulando de um site a outro, pesquisando nomes, números, arquivos, lendo reportagens antigas, vamos desenhando dois mapas. O primeiro deles é o das “curiosidades”. Neste mapa, empresa que financiou vereador aparece como prestadora de serviços na folha de gastos da Câmara do mesmo vereador que ajudou a eleger. Pessoa física que doa polpudas quantias a um candidato é dono de empresa que doa quantias igualmente polpudas, mas com CNPJ, ao mesmo candidato.
Já o segundo mapa aparece com uma espessa nuvem de poeira por cima ocultando o traçado do dinheiro doado a diretórios e comitês dos partidos. Curiosamente – ou não tão curiosamente assim -, a falta de transparência sistêmica que oculta a origem do dinheiro em algumas das planilhas do TSE é a mesma que oculta do perguntador (jornalista ou não) a origem da resposta que ele procura. Uma fonte leva a outra que leva a outra que leva a outra e a outra, e esta última leva a lugar nenhum.
Esta reportagem será publicada dentro de alguns dias no site do projeto, ainda em fase de produção. Sem dúvida é uma das reportagens mais importantes do AG – por isso a escolhemos como uma das primeiras -, já que nos leva à raiz da resposta a um dos nossos principais questionamentos: por que a cidade vem sendo construída dessa forma, à revelia da vontade e das necessidades da maioria dos cidadãos?
Que há uma raiz para essa pergunta, há. Difícil é encontrá-la embaixo de tanta terra que vez e outra jogam por cima. Seguimos cavando.