Kassab, prefeito cuja gestão foi marcada por críticas a sua relação enviesada com empreiteiras, encabeça grupo que ensina como administrar grandes cidades
No início deste ano, a Universidade de São Paulo (USP) criou um núcleo de pesquisas sobre planejamento e gestão de cidades chamado USP Cidades. Voltado a gestores, o objetivo do núcleo, segundo seu site, é incidir no debate público sobre soluções para questões urbanas e “servir como ponto de referência para a articulação entre a gestão pública, a pesquisa aplicada e o setor privado, para tratar dos principais desafios das cidades no país”. O núcleo tem sede no prédio da administração central, na Cidade Universitária, zona oeste de São Paulo.
Para encabeçar o grupo, o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD) foi convidado pelo próprio reitor da universidade, João Grandino Rodas. A justificativa para a nomeação, como consta no site, é “a experiência do Prefeito na gestão de uma grande cidade”.
Junto com Kassab, fazem parte do núcleo ex-servidores públicos que atuaram em sua gestão (2006-2012). Entre eles está Miguel Luiz Bucalem, atual coordenador acadêmico do núcleo e que em 2007 assumiu a chefia da Assessoria Técnica de Planejamento Urbano da Secretaria Municipal de Planejamento da Prefeitura de São Paulo. Entre 2009 e 2012, Bucalem encabeçou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU). Como secretário executivo do USP Cidades está Domingos Pires de Oliveira Dias Neto, que entre 2010 e 2012 foi diretor da São Paulo Urbanismo (empresa pública responsável por desenvolver ações ligadas ao planejamento urbano do município) e entre 2011 e 2012 foi Secretário Municipal Adjunto de Desenvolvimento Urbano. Coordenando a secretaria executiva do núcleo está Maria Teresa Diniz, que encabeçou por 5 anos o GT Projetos na Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo (SEHAB). Para conhecer os demais membros do núcleo, clique aqui.
Não está claro se a nomeação destas pessoas foi feita também por Grandino Rodas ou por Gilberto Kassab.
Trabalho escravo e contratos suspeitos
O projeto Arquitetura da Gentrificação (AG) está há quase dois meses (56 dias hoje, 25/11) buscando informações sobre o USP Cidades. No escopo do projeto, interessa saber detalhes sobre a atuação do ex-prefeito no grupo, critérios de seleção dos membros do núcleo e como este é administrado. Além disso, interessa saber detalhes sobre orçamento do USP Cidades, repasses e fonte da verba, uma vez que se trata de entidade pública. Finalmente, o projeto questiona qual o tipo de parceria que o núcleo mantém, segundo consta em seu site, com a Construtora OAS e com a Revita Engenharia, e qual a postura do núcleo sobre estas duas parcerias considerando que a OAS foi flagrada por auditores do Ministério do Trabalho empregando mão de obra escrava no canteiro de obras de ampliação do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, e que o Grupo Solví, ao qual pertence a empresa Revita Engenharia, é acusado de firmar contratos sem licitação com as prefeituras de Porto Alegre (RS) e João Pessoa (PB) por meio da própria Revita Engenharia.
A saga dos emails
A primeira troca de emails entre o AG e assessora de comunicação do USP Cidades, Paula Vianna Queiroz e Souza, aconteceu em 30 de setembro, após contato telefônico no qual Paula sugeriu o envio das questões por email. No mesmo dia a assessora afirmou, por email, que buscaria um responsável capaz de responder às questões e que daria um retorno no dia seguinte, 1 de outubro.
Apenas 23 dias depois daquele primeiro contato e após alguns telefonemas e duas cobranças formais por email feitas pelo AG é que Paula Vianna deu o primeiro retorno sobre as perguntas feitas em 30 de setembro.
Seguem abaixo a resposta por email da assessora e a réplica enviada pelo AG no mesmo dia, 23 de outubro. Por email, o AG voltou a cobrar um retorno em 25 de outubro, mas não obteve resposta. Em 31 de outubro – portanto um mês após a primeira solicitação – a própria coordenadora da secretaria executiva do núcleo, Maria Teresa Diniz, enviou um email ao AG sugerindo, mais uma vez, que as respostas fossem procuradas no site do USP Cidades. Site alterado e lei de acesso à informação
Conforme prometido no email acima, o AG reencaminhou a Teresa Diniz toda a troca de emails realizada anteriormente com a assessora de comunicação, Paula Vianna. No primeiríssimo email constavam as perguntas. Quando o AG fez sua primeira solicitação de informação ao USP Cidades, em 30 de setembro, nenhuma das perguntas enviadas encontravam resposta no site, que foi lido e relido diversas vezes antes do envio das perguntas, como é de praxe entre os jornalistas. Pelo menos até 23 de outubro ele permanecia com as mesmas informações de quando foi visitado pela primeira vez pelo AG.
Alguns dias depois, no entanto, o site foi alterado com a inclusão de informações que respondiam a algumas das perguntas. Após uma nova troca de emails com Maria Teresa Diniz (veja abaixo) e com base nas informações disponibilizadas no site, o AG reformulou as questões, retirando aquelas que já haviam sido respondidas pelo novo conteúdo do site e reformulando as que ainda não tinham sido contempladas.
Apesar das novas informações incluídas no site do núcleo, a página ainda não traz os dados públicos básicos obrigatórios pela Lei de Acesso à Informação, especialmente os que se referem a recursos e movimentações financeiras e que são tema de algumas perguntas enviadas à entidade pelo AG.
O último contato do Arquitetura da Gentrificação com o USP Cidades foi feito em 7 de novembro, por email. O projeto está há 18 dias aguardando resposta para esta última solicitação. Ao todo, são 58 dias desde o primeiro pedido de informações, em 30 de setembro, quantidade muito além dos 20 dias previstos como máximo pela Lei de Acesso à Informação (prorrogáveis por mais 10 mediante justificativa expressa).